Sobre o copy paste do programa de governo
O PS pegou no seu programa eleitoral e transformou-o num programa de governo.
1. Desadequação: Um programa eleitoral pensado para atingir o PCP e o BE eleitoralmente não está em conformidade com as exigências da realidade;
2. Descontextualização: Não tem em consideração as consequências da guerra na Ucrânia, nem as implicações da inflação na vida dos portugueses;
3. Desinteresse: Sabendo-se que agora se verificam outros condicionalismos, tendo o PS maioria absoluta, a teimosia em fazer um “copy paste” só pode ser interpretado como desinteresse ou incapacidade para responder às circunstâncias- Eventualmente pode significar ambas.
Sendo possível caracterizar o programa de governo do XXIII Governo por estes 3 D’s – desadequação, descontextualização e desinteresse –, é este um sinal sobre o tipo de leitura da realidade, da abertura dialogal e da responsabilidade que podemos esperar do Governo?
Este programa parece ser mais do PCP e do BE do que do PS. Os pressupostos gerais demonstram uma clara intenção de intervencionismo directo, a vários níveis, do que de regulação. Para além disso, a maioria das propostas apresentadas implicam um aumento da burocratização como se Portugal já não fosse um país excessivamente burocrático. O que os agentes económicos necessitam é de mais simplificação normativa, baseada em clareza e transparência.
Adicionalmente, é impossível não notar uma postura ideológica que provoca um notório desequilíbrio, direi até permanente, entre as obrigações e responsabilidades que cabem as ambas as partes que estabelecem um qualquer vínculo contratual.
Disponibilidade à Arménio Carlos!
Arménio Carlos está “completamente disponível” para colaborar com a UGT.
Basta apenas uma pequeníssima coisa para essa disponibilidade ser completa.
Que se cuide Carlos Silva. Ou ainda acaba sindicalizado pela CGTP
Interferências do homem na Ciência e na Religião
Na relatividade do tempo humano, a consciência da existência é um choque duma magnitude incomensurável.
Perceber que somos uma ínfima parte na multiplicidade de formas existenciais que compõem o todo que nos rodeia não é fácil. Perceber que não somos criadores do universo que nos faz ainda mais difícil é.
Paradoxalmente, é nesse instante que a presença do divino mais se manifesta.
Criador e Criação
Deus é
mas não como dizem ser.
Deus encontra-se
na verdade que se percebe por trás
das alegorias,
histórias
e interferências do homem
A verdade não são dogmas
porque os dogmas escondem a verdade.
E o que é Deus?
Deus é princípio e fim.
É um caminho a seguir
numa busca incessante.
É um ideal e evolução.
O dever ser
que nunca devemos atingir.
Para homens continuarmos a ser.
Para nunca deixarmos de sonhar
e de tentar.
in Metafísica [Poética]
Como tal, esta tomada de consciência implica o franquear de múltiplos horizontes que, por sua vez, tanto possibilitam o desenvolvimento do conhecimento humano como a tangibilidade da presença de Deus.
É precisamente na convivência paradoxal da dualidade que o homem prossegue a caminhada da sua continuidade.
Ora, se considerarmos que um binómio é uma expressão algébrica composta de dois membros unidos por sinal positivo ou negativo, esta dualidade é um binómio intrínseco à condição humana.
Consequentemente, as perguntas são um ímpeto dual, um impulso que simultaneamente nos leva à progressão individual e ao conhecimento do mundo que nos rodeia.
Logo, considerando a multiplicidade de dimensões que são imanentes às manifestações culturais, podemos afirmar que a ausência de perguntas desvirtua o caminho, que sem elas esmaece, lentamente, o elo com a origem integral, pois nada evolui sem aprendizagem, sem as dúvidas intrínsecas às premissas.
Contudo, sendo um instrumento que traduz a afirmação cultural nas circunstâncias temporais, uma vez que estas evoluem, as perguntas devem ser ciclicamente reformuladas. Não apenas como nexo causal para a confirmação do conhecimento, mas igualmente como manifestação do desconhecimento.
Mas o homem não é apenas razão. E como a cultura é a representação duma cosmologia social, nem todo o saber é empírico e/ou cientificamente comprovado. Outras cosmogonias também fazem o homem. E é nesta dupla coexistência, inerente à cultura e coerente com a condição humana, que as relações entre a ciência e a religião se desenvolvem.
No entanto, a complexidade destas relações não começa nem finda na condição humana. Elemento de não somenos importância é a natureza humana.
Os avanços e progressos (alguns dirão recuos e retrocessos) tecnológicos, políticos, jurídicos, sociais, etc., que a organização da vida em sociedade experimentou no correr dos tempos não foram, aparentemente, acompanhados pela evolução da natureza humana. Qualquer alteração da sua essência é praticamente imperceptível.
E convém recordar que não é só a razão que é falível. Os sentimentos que fazem as emoções também cegam.
Paradoxo
“A fé move montanhas”.
Mas,
como é desprovida de razão,
também as arrasa.
in Aforismos e Reflexões [Poética]
É dentro destas condicionantes, razão e emoção, nas suas clarividências e obscuridades, que o homem se expressa culturalmente.
Abordar as zonas de intersecção da cultura humana não é fácil, principalmente sendo o homem um ente dual de raciocínio e paixão. E, usualmente, da reflexão sobre estes pontos de contactos resultam posições antagónicas. As relações entre a ciência e a religião não são excepção. O exemplo mais ilustrativo desta afirmação é o intenso debate entre evolucionistas e criacionistas dentro da cultura anglo-saxónica.
Apesar de distinguir entre ciência e religião, o confronto não é a via que trilho. Entre a ciência e a religião há um contínuo reajustamento, pois ambas pressupõem o mesmo intento: a procura da verdade. Como tal, devem ser, e são-no, um permanente diálogo.
Recordando palavras de Dom Manuel Clemente, Bispo do Porto, “o importante será compreendermos como religião e ciência se tornam complementares e interactivas na melhor definição recíproca. Como geralmente acontece, o crescimento delas realiza-se como autêntica “crise de crescimento”: a afirmação da mentalidade científica exigiu a redefinição da esfera religiosa; e a persistência da religião, em sucessivas decantações, situou a ciência no seu campo específico, tanto em termos de método e objecto como em lúcida auto-limitação, para poder prosseguir com segurança e acerto.”
Convergência
“A ciência é apenas uma verdade. A outra é a fé” – Novalis
O uno é divisível!
Em dois,
em quatro,
em vários.
Mas, sem realidade e espírito
não há verdade.
Todas as suas partes
só o são se encaradas em si.
O uno é o todo!
Fora do todo, só o vazio.
E o vazio
é o espaço onde o todo se expande.
in Metafísica [Poética]
É curiosa esta afirmação de Novalis. Será que só o homem religioso tem fé? É evidente que não!
Qual é o cientista que no desenvolvimento da sua investigação não tem fé no resultado desejado? Claro que se o conceito de fé tiver uma interpretação rígida, a metodologia científica não terá cabimento no seu âmbito. Mas, se a fé está “vedada” aos cientistas, estará a ciência interdita aos homens de Deus? É igualmente claro que não!
Quantos sábios não foram – e são – homens profundamente crentes? E quantos membros da igreja não foram – e são – brilhantes cientistas?
Expressando preferências pessoais, indico, como referência dos primeiros, Galileu e Einstein. E como alusão dos segundos, Santo Agostinho e Teilhard de Chardin.
Muitos mais nomes poderiam ser referidos. Todos eles exemplos paradigmáticos, o que é demonstrativo dum longo e frutuoso diálogo que, felizmente, ainda não terminou.
Lê-se, na Nova Atlântida de Francis Bacon, a seguinte passagem: “Senhor Deus do Céu e da Terra, concedeste a tua graça … para conhecerem os Teus trabalhos da Criação e os verdadeiros segredos deles, e discernirem (até ao ponto em que tal compete às gerações de homens) entre os milagres divinos, obras da Natureza, obras humanas e imposturas e ilusões de toda a espécie!”
Aqui, ao ler este trecho, é plausível interpretar fé da seguinte maneira:
O caminho para o Senhor
manifesta-se como Ele quer
e não como o homem diz.
A fé não é definida,
nem é um exclusivo da igreja
ou de qualquer outra crença.
A fé é uma graça oferecida por Deus!
Em qualquer tempo,
em qualquer espaço,
em qualquer coração.
in Deuses, Homens e o Universo
Porém, uma interpretação sobre fé não é a única aferição do texto. Também compete ao homem discernir sobre o universo que o rodeia e em que é parte.
Este é o busílis da situação. É precisamente na tentativa de conhecer melhor o mundo onde está inserido que as interferências do homem mais se notam.
Depois de séculos de ensinamento escolástico, o renascimento provocou uma ruptura no pensamento vigente e originou fortes convulsões no seio da religião. Inevitavelmente, as relações entre a ciência e a religião foram afectadas e percepções erradas ainda persistem. Nas palavras de Teilhard de Chardin, “aparentemente, a Terra Moderna nasceu de um movimento anti-religioso. O Homem bastando-se a si mesmo. A Razão substituindo-se à Crença. A nossa geração e as duas precedentes quase só ouviram falar de conflito entre Fé e Ciência. A tal ponto que, a certa altura, pareceu que esta era decididamente chamada a tomar o lugar daquela”.
Sendo inegável que a Idade Moderna permitiu à ciência uma progressão sem precedentes, porque é que este avanço tem significar o recuo de Deus?
Evoco de novo Teilhard de Chardin: “Ora, à medida que a tensão se prolonga, é visivelmente sob uma forma muito diferente de equilíbrio – não eliminação, nem dualidade, mas síntese – que o conflito se resolverá.”
Podemos, então, considerar que a distinção e/ou a separação apenas existe na interferência do homem.
Como igualmente podemos afirmar que na mesma medida em que esta permite o imenso de possibilidade à ciência, já no que respeita a Deus, parece representar a impossibilidade da mutação. Dito por outras palavras, enquanto a ciência não prescinde da mudança, para a religião a mutabilidade significa o desvirtuar da mensagem. Saliente-se que para religiões e deuses anteriores, a imutabilidade levou ao seu desaparecimento. Assim, há uma “aparente” vantagem da ciência por ser conforme à evolução.
Contudo, expressando uma interpretação pessoal, esta nuance também reside em Deus.
Basta ler a Bíblia para nos apercebermos duma cronologia temporal que nos vai revelando que a mensagem contida no Antigo Testamento é substancialmente distinta da do Novo Testamento. Como aquele é anterior a este, é possível extrapolar, dentro dos imites da compreensão humana, uma evolução na essência de Deus. É inegável que o amor de Cristo/Filho vem substituir o “ódio” de Deus/Pai. Logo, uma pergunta é razoável: a mudança na mensagem que nos é transmitida pela Bíblia não pode ser vista como uma evolução de e em Deus?
E neste ponto retornamos às interferências do homem. Todavia, é aqui que desvendamos os meios de expressão das interferências humanas. São eles: a tolerância e a intolerância.
O potencial de aumento de conhecimento é geometricamente proporcional ao universo do desconhecido, com a certeza que o desconhecimento aumenta na mesma medida em que mais é conhecido. Reformulando, poderíamos dizer que a ciência é o Conhecimento e Deus o Desconhecimento e que a fronteira entre ambas estará sempre sujeita a novas reinterpretações.
Portanto, no limite, tudo é questionável. E o que é, se for genuíno, continuará a sê-lo depois das perguntas. Para mim, Deus é genuíno. Principalmente após as perguntas.
Então, serão a ciência e religião afectadas pelas perguntas? Sem dúvida. Mas trata-se de uma influência de âmbito individual, cuja resposta reside no coração de cada homem.
Heraclito de Éfeso disse: “Nada é permanente, salvo a mudança.” A evolução é uma constante universal. E Deus também se rege pela evolução. Mesmo sendo Criador.
Não se deve falar pelos outros, pois os outros são como são e quase nunca como gostaríamos que fossem. Como tal, no meu coração, a coexistência entre Ciência e Deus é necessária.
É o que me impele para o futuro.
Duas visões distintas, mas plenamente complementares, que nos indicam o caminho no sentido da verdade esclarecida e responsável.
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